A hipnose sempre despertou curiosidade e, ao mesmo tempo, levantou muitas dúvidas.
Durante muito tempo, ela foi associada a truques de palco, mistérios e até mesmo desconfiança.
No entanto, nas últimas décadas, a neurociência tem se dedicado a investigar esse fenômeno de maneira séria e sistemática.
Os avanços na tecnologia de imagem cerebral, como a ressonância magnética funcional (fMRI) e o eletroencefalograma (EEG), permitiram observar o que acontece no cérebro durante o estado hipnótico.
Mas afinal, o que a ciência já descobriu sobre a hipnose?
A hipnose é um estado alterado de consciência
Primeiramente, é importante destacar que a hipnose não é sono nem simples relaxamento.
De acordo com a neurociência, trata-se de um estado alterado de consciência, caracterizado por foco atencional profundo, aumento da receptividade às sugestões e mudanças na percepção.
Pesquisas conduzidas pela Stanford University mostraram que, quando uma pessoa está em transe hipnótico, áreas do cérebro relacionadas à atenção e ao controle cognitivo, como o córtex pré-frontal e o cíngulo anterior, apresentam maior atividade.
Isso explica por que, sob hipnose, o indivíduo consegue se concentrar intensamente em uma ideia ou sugestão, filtrando distrações externas.
Alterações reais na percepção
Um dos aspectos mais fascinantes estudados pela neurociência é que a hipnose modifica, de fato, a forma como o cérebro percebe a realidade.
Não se trata apenas de “imaginar” algo diferente, mas de experimentar mudanças genuínas.
Por exemplo, estudos com imagens cerebrais mostram que, quando uma pessoa hipnotizada recebe a sugestão de que está sentindo dor, áreas cerebrais ligadas à dor realmente são ativadas.
Da mesma forma, se a sugestão é de alívio ou anestesia, essas áreas apresentam redução de atividade. Isso significa que a hipnose pode alterar não apenas a interpretação mental da dor, mas também o processamento fisiológico da experiência dolorosa.
Assim, fica claro que a hipnose não é “teatro”, mas sim uma ferramenta que gera efeitos mensuráveis no cérebro.
Hipnose e o gerenciamento da dor
Entre os campos mais estudados pela ciência está o uso da hipnose no controle da dor.
Pesquisas publicadas em revistas científicas de alto impacto, como a Journal of the American Medical Association (JAMA), já comprovaram a eficácia da hipnose em cirurgias, tratamentos odontológicos e no manejo de dores crônicas.
Isso acontece porque, sob hipnose, o cérebro consegue modular os sinais de dor. Áreas como o córtex somatossensorial e a ínsula, responsáveis pela percepção dolorosa, reduzem sua atividade.
Em contrapartida, áreas ligadas ao controle cognitivo e emocional aumentam sua influência, ajudando o paciente a reinterpretar a dor.
Portanto, a neurociência confirma: a hipnose pode ser uma ferramenta poderosa no alívio de dores físicas, inclusive quando medicamentos não são suficientes.
O cérebro em transe hipnótico
Outra descoberta importante é que, durante a hipnose, o cérebro não “desliga”. Pelo contrário, ele funciona de maneira diferente.
Pesquisadores da Harvard Medical School identificaram que, em transe, há uma maior conectividade entre regiões do cérebro. Isso significa que áreas normalmente independentes passam a se comunicar com mais intensidade.
Esse aumento de conexões explica por que a hipnose é eficaz em promover mudanças de hábitos, superar fobias ou ressignificar memórias. O cérebro, em estado hipnótico, fica mais flexível e receptivo a novas informações.
Hipnose não é perda de controle
Muitas pessoas têm medo de que a hipnose as faça perder o controle. A neurociência, no entanto, já demonstrou que ninguém faz algo contra a própria vontade durante o transe.
Pesquisas indicam que as áreas ligadas ao senso de moralidade e julgamento crítico permanecem ativas no cérebro hipnotizado. Ou seja, a pessoa continua consciente de seus valores e limites.
Isso reforça a ideia de que a hipnose terapêutica é um processo de colaboração entre o hipnoterapeuta e o cliente, e não de manipulação.
A influência da imaginação e da sugestão
Outro ponto confirmado pela neurociência é a força da imaginação sob hipnose. Quando alguém imagina uma situação em transe, o cérebro reage de maneira semelhante a quando vivencia a experiência real.
Por exemplo: ao imaginar comer um alimento azedo, as áreas ligadas ao paladar são ativadas como se realmente houvesse estímulo físico. Isso explica por que a hipnose é tão eficiente em tratar questões emocionais e comportamentais — o cérebro responde às sugestões como se fossem experiências concretas.
Aplicações práticas já validadas pela ciência
Graças a essas descobertas, a hipnose vem sendo aplicada em diferentes áreas da saúde e bem-estar. Entre elas, podemos destacar:
- Controle da dor: especialmente em dores crônicas, fibromialgia, enxaquecas e até em procedimentos cirúrgicos.
- Tratamento de ansiedade e fobias: ao reprogramar respostas emocionais, o cérebro passa a reagir de maneira mais equilibrada.
- Cessação do tabagismo e mudanças de hábitos: a hipnose ajuda a fortalecer a motivação e reduzir gatilhos inconscientes.
- Melhora da qualidade do sono: ao induzir relaxamento profundo e reduzir a atividade mental acelerada.
- Apoio em quadros de depressão leve: auxiliando na mudança de padrões de pensamento negativos.
Cada vez mais, clínicas e hospitais reconhecem a hipnose como recurso complementar, integrando-a a tratamentos convencionais.
O futuro das pesquisas em hipnose
Apesar dos avanços, a ciência ainda tem muito a descobrir sobre os mecanismos exatos da hipnose.
O que já está claro, porém, é que ela é um fenômeno real, com efeitos mensuráveis e aplicações práticas.
Pesquisadores continuam investigando como diferentes cérebros respondem ao transe, já que algumas pessoas são mais suscetíveis à hipnose do que outras.
Além disso, estudos recentes buscam compreender como esse estado pode ser usado para acelerar processos de aprendizagem, potencializar a neuroplasticidade e até apoiar o tratamento de doenças neurodegenerativas.
Portanto, podemos esperar que, nos próximos anos, a hipnose seja cada vez mais reconhecida como uma ferramenta científica, deixando definitivamente para trás os mitos que a cercam.